A necessidade de ser grande e de saber em quê

Se há matéria de celebração, no aniversário do INESC, é a grandeza da visão que lhe está na génese, e se há palavra definidora, será ousar.

O INESC nacional (ou seja, incorporando o INESC no Porto), nasceu em 1985 à sombra de uma ameaça sentida: a integração numa união europeia que poderia ser esmagadora, se nada se fizesse. Foi a temível consciencialização do drama do pigmeu entre gigantes.

A ideia do INESC nacional foi ganhar escala: ser grande, agigantar-se. Pulverizado, anestesiado em rivalidades académicas mesquinhas e estéreis, Liliput facilmente seria digerido por Brobdingnag.

Com a constituição em 1988 do INESC Porto, embrião do INESC TEC, o drama foi revisitado, na forma de regresso a uma pequenez regional. O espírito original inesquiano, porém, prevaleceu, reinventou-se: ser grande é, afinal, incluir a diversidade, tomá-la como sua, rejeitar o particularismo. Essa agenda teve duas componentes, importa evidenciá-lo.

Numa vertente institucional, INESC TEC abriu-se ao Politécnico do Porto e às Universidades do Minho e de Trás os Montes e Alto Douro. Instituições que historicamente se poderiam olhar com rivais, convergiram em cooperar mais do que competir. Nestas coisas da humanidade, parece que quanto mais vizinhos, mais difícil o entendimento, por isso aglutinar esta convergência é obra. É, também, exemplo.

Quanto ao modelo, o INESC TEC apurou o que seria a ideia original, em dois sentidos: conservou e robusteceu uma cadeia de produção de conhecimento a valor, integrando vocações pessoais distintas, da investigação fundamental à aplicação empresarial, e cultivou uma multiplicidade coerente de competências, da física à gestão industrial, aglutinadas pela eletrotecnia. A diversidade no seu esplendor.

De tudo isto, resultou um universo multi-institucional, de mais de mil pessoas, e um orçamento anual inimaginável nos tempos da infância. E tudo isto é verdade – porém, não é a verdade que mais interessa reter. A grandeza em números não é a Grandeza, é apenas uma caraterística decorrente de algo mais profundo. A grandeza do INESC TEC está na cultura que conseguiu implantar: de rigor, cooperação sem olhar à camisola, trabalho, honra de compromissos, paixão pela ciência, motivação pela cooperação com a indústria, pulsão pela transformação de Portugal.

O caminho para a grandeza do INESC TEC fez-se porque houve sonhos e protagonistas – e ambição. Não nos iludamos: os sonhos de grandeza foram sempre, em certo sentido, difíceis de digerir no início, porque disruptivos – mas, por causa dos protagonistas, foram disrupções assumidas como credíveis e, por isso, mobilizaram as suficientes gentes para se tornarem imparáveis.

Os riscos de hoje? Autossatisfação, rapidamente transformada em arrogância. Conformismo, facilmente convertido em passiva aceitação do status quo. Renúncia a sonhar, penosamente abrindo caminho para o regresso ao passado de vivências e comportamentos.

Recusar uma agenda de crescimento será, nesta perspetiva, um erro colossal. E o perigo de nos vermos instalados e nos acharmos confortáveis no planalto da curva logística só se reforça, se a nossa gestão de ciência, em todos os níveis, substituir a audácia pela minúcia e a irreverência pela obsessão administrativa. Não há poesia bastante num manga de alpaca.

O INESC TEC precisa, mais que nunca, de ideias-bandeira. Antes de sonhar, precisa ousar sonhar. Precisa crescer. Precisa se converter num federador de grandes centros internacionais. Precisa de ganhar estatuto de forte referência mundial. Precisa de se superar, de se transcender, não ser apenas uma instituição portuguesa, ser europeia. Precisa de liderar iniciativas, e não seguir iniciativas: na saúde, nos oceanos, no espaço, no combate às alterações climáticas, na cibersegurança, o INESC TEC tem que ter uma agenda disruptiva liderante e construtora de novas realidades – não ser apenas o apêndice tecnológico de ideias alheias.

E precisa de se reinventar. Não sou da altura que me veem, mas sim da altura que meus olhos podem ver, escreveu Pessoa, e lucidamente.

Vladimiro Miranda, Diretor Associado

PHP Code Snippets Powered By : XYZScripts.com
EnglishPortugal