O estereótipo, a expectativa e a realidade e ser uma mãe (que trabalha)

Por Nabila As’ad, do Centro de Engenharia e Gestão Industrial (CEGI)

Existe um vídeo viral de uma pivot/jornalista indonésia Najwa Shihab a ser entrevistada por um comediante num programa de televisão. Najwa é uma das mulheres mais influentes na Indonésia. É conhecida pela sua abordagem direta e minuciosa quando entrevista políticos – muitas vezes, o seu alvo são os políticos corruptos. Na entrevista viral, o comediante pergunta-lhe: “Se pudesse escolher: entre ser jornalista ou ser mãe a tempo inteiro, qual escolheria?” Najwa respondeu, “Por que razão é que as mulheres têm de escolher? Não podemos ser as duas? Este tipo de questões tem posicionado as mulheres como sendo incapazes (isto é, como se não tivessem capacidades para tal)”. Para se ter uma ideia sobre o fenómeno viral deste vídeo, transmitir-vos-ei o ponto vista geral da sociedade indonésia. Embora tenhamos uma figura de emancipação da mulher – a Kartini – e nacionalmente celebramos o seu aniversário para comemorar essa igualdade, a sociedade ainda continua a lutar para remover o estereótipo limitado sobre as mulheres, ou seja, aquelas que dão à luz, depois cuidam dos filhos, do marido e das tarefas domésticas intermináveis. A boa notícia é que o estereótipo tem vindo a desaparecer ligeiramente nas grandes cidades e nas gerações atuais de pais jovens.

No entanto, o debate sobre “mãe que trabalha VS mãe a tempo inteiro” prossegue atualmente, não apenas na Indonésia – como podem ver na entrevista de Najwa Shihab, mas também a nível global. Eu escolhi as duas opções e, como tal, podia identificar-me com a resposta da Najwa. Evidentemente que a minha decisão tem as suas consequências. Por exemplo, se alguém me perguntasse qual foi a coisa mais mágica que já vi, eu responderia sem qualquer hesitação: ver a minha bebé crescer. No entanto, não passei o tempo todo a vê-la crescer e sim, senti-me culpada quando perdi uma conquista importante dela. Além disso, a realidade de ser uma mãe que trabalha*) não é tão glamorosa como a que é retratada nas redes sociais.

Outro estereótipo rotulado nas mulheres é o multitasking. A sociedade espera que as mulheres sejam capazes de equilibrar o volume de trabalho com as tarefas domésticas. Aliás, um estudo publicado na American Sociological Review explica que as multitarefas estão relacionadas com as crescentes emoções negativas, encargos e stress das mães; em comparação com as dos pais com volumes de trabalho semelhantes (Offer and Schneider, 2011). Além disso, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas para 2030 registam que as mulheres “dedicam em média cerca de três vezes mais horas por dia à prestação de serviços gratuitos e ao trabalho doméstico do que os homens, limitando assim o tempo disponível para o trabalho remunerado, educação e lazer e reforçando ainda mais as desvantagens socioeconómicas baseadas no género.”

Em vez de me arrepender da minha decisão de ser uma mãe que trabalha, vejo esta decisão como um privilégio e uma oportunidade para mim mesma de fazer aquilo que gosto. Adoro a minha bebé, e também adoro o que faço. Estou grata pelos meus colegas no INESC TEC me valorizarem pela minha capacidade de investigação e por quem sou. Acho importante que qualquer organização/empresa proporcione um ambiente social acolhedor para as mulheres. Além disso, uma das novas ambições do mundo, como referido nos ODS, é dar poder às mulheres e raparigas. Não pretendo que vejam os problemas sociais, mas sim incentivar cada pessoa a pensar e refletir: o que podemos fazer, enquanto ser individual e como parte da sociedade em geral, para dar poder às mulheres e às raparigas? Porque, mais uma vez, queremos “garantir que todos os seres humanos possam realizar o seu potencial com dignidade e igualdade e num ambiente saudável” (Documento de trabalho dos ODS, 2015, pag. 2).”

Por outro lado, enquanto mãe que trabalha e como mulher na sociedade mundial, quero incentivar todas as mulheres a terem fé em si mesmas. Desta forma, podemos dar prioridade a nós mesmas e, mais importante, amarmo-nos. Além disso, se alguma mulher achar que precisa de algum tipo de ajuda, por favor não hesite em pedi-la.  As mulheres têm vozes e direitos para tomar decisões e não há nada de errado em deixar que outras pessoas ouçam os vossos pensamentos e ideias. Como adoramos realizar várias tarefas, aprendi muito com as minhas colegas mais velhas (que também são mães que trabalham). Ensinaram-me que é importante traçar objetivos e planear conquistas. Este plano irá ajudar-vos a gerir as vossas atividades e energia. Aprendi isto um pouco tarde, uma vez que tive que poupar a minha energia para ir atrás de uma bebé corredora.

Entretanto, o Natal está a chegar. Aposto que a maioria de vocês terá a oportunidade de se encontrar com a vossa mãe. Incentivo-vos a abraçá-la (e ao vosso pai) com força, porque as famílias são os valores mais importantes da vida.

Boas festas!

Nabila

 

*) Escolhi o termo “uma mãe que trabalha” para abranger o duplo papel das mães. Constato muitas vezes que as minhas amigas, que escolheram ser mães a tempo inteiro (como muitos rotulam), gerem os seus próprios negócios a partir de casa.

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