Só avança quem descansa

Por Rita da Costa, designer de comunicação no Serviço de Comunicação

Quando entrei no INESC TEC, de muitas formas diferentes, senti-me num planeta alienígena: por ver todas as tecnologias que estavam a ser desenvolvidas, por entrar num ambiente tão denso de investigação e ciência de ponta, e claro, porque a minha formação base é de artes plásticas – pintura e intermédia.

O meu ambiente de conforto estava por entre conceitos, pincéis, lápis e aguarelas. Sempre tive interesse por tecnologia, mas maioritariamente sobre a forma como as artes e o entretenimento veem a tecnologia. Cresci a jogar videojogos, a ler banda desenhada, a desenhar personagens que admirava e a questionar-me sobre quando iriam as maravilhas da ficção científica atravessar as fronteiras da ficção para a minha realidade.

Em 1966, Star Trek começa a ser exibido nas televisões. Uma série televisiva sobre jornadas no espaço, entre humanos e alienígenas que servem a Frota Estelar, que defendem e protegem a Federação Unida dos Planetas.

Entre as tecnologias usadas em Star Trek está o Comunicador, uma espécie de telemóvel que lhes permite estar em contacto e que tem rastreador de localização. Em 1973 a Motorola apresenta o seu primeiro telemóvel. E em 1989 desenham o seu primeiro flip phone. Hoje em dia é possível comprar uma réplica deste comunicador de Star Trek que emparelha com o smartphone via bluetooth.

Para além do comunicador, Star Trek imagina um dispositivo de impressão 3D de comida e objetos do dia-a-dia, chamado “The Replicator”.

Hoje em dia já se utiliza a impressão 3D para criar objetos de plástico, metal e vidro. A Mattershift afirma que desenvolveu membranas de nanotubos de carvão que podiam separar e juntar moléculas, abrindo portas e possibilidades para conseguir imprimir alimentos, combustível ou medicamentos.

As bandas-desenhadas da Marvel imaginam um super-herói cujos superpoderes advêm de um fato altamente tecnológico, o Iron Man. Apesar de ainda não existir um fato que nos permita voar por aí, a Força Militar Americana está a trabalhar em tecnologia que irá replicar algumas das capacidades do adorado super-herói da Marvel. O programa TALOS (Tactical Assault Light Operator Suit) tem como objetivo aumentar e melhorar a capacidade humana de combate. Carrega informação de drones, sensores navais e reconhecimento aéreo para informar os soldados. A expectativa é de um fato leve que inclua sistemas de suporte de vida que irão rastrear o estado de saúde do soldado.

Em 1962, os desenhos animados The Jetsons mostravam que as personagens conseguiam ver nos seus relógios programas de televisão a cores e conseguiam executar chamadas telefónicas para a família. Apesar de os smartwatches ainda não terem a possibilidade de streaming de vídeo, as chamadas já são possíveis, assim como a visualização de fotos e mais algumas características. The Jetsons não previram só os smartwatches, previram também nos seus episódios drones e hologramas.

O holograma foi também imaginado por George Lucas em Star Wars. No célebre filme, de 1977, vemos Luke Skywalker a receber uma mensagem de Leia através do adorável R2D2, mensagem essa mostrada em forma holográfica. Hoje em dia a ideia de holograma já é facilmente replicada com sistemas de ventoinhas luminosas. Apesar de estas ventoinhas criaram uma ilusão de ótica que simula uma projeção holográfica, existem já vários esforços da ciência para criar hologramas com os quais o ser humano possa interagir.

Em 1968, no filme 2001: A Space Odyssey conseguimos ver a ideia de vídeo chamada, tal como no Regresso ao Futuro II, ou mesmo, em 1927, no filme Metrópolis de Fritz Lang. Apesar de serem retratadas de formas diferentes, as três narrativas consideraram esta possibilidade antes desta tecnologia ter sido feita. Por exemplo, no Regresso ao Futuro II conseguimos ver a identificação da pessoa que está a fazer a chamada, como os passatempos, bebidas preferidas, etc. Um pouco à semelhança do que acontece hoje em dia com a conexão que podemos estabelecer nos nossos dispositivos entre o contacto telefónico e as redes sociais.

Por fim, em 1931, Aldous Huxley, no seu romance distópico Admirável Mundo Novo, fala-nos de um comprimido chamado Soma, um comprimido antidepressivo alucinogénio que eliminava sentimentos de tristeza. Duas décadas depois deste livro, a ciência começou a investigar sobre antidepressivos, sendo que a primeira ligação entre depressão e químicos no cérebro foi estabelecida em 1951.

Perdoem-me o geek spam com toda esta enumeração de casos onde a tecnologia se alia à arte, mas, pessoalmente, considero de extrema importância o tempo de lazer.

Vemos muitas vezes o tempo de lazer como tempo obrigatório a repouso total, e muitas vezes chegamos até a sentirmo-nos culpados por em determinadas alturas não estarmos a produzir produtos, ideias ou conhecimento. Quando na verdade, quando estamos dedicados a uma ideia, a um projeto ou a uma tarefa, esta corrente de pensamento vai atravessar as nossas vivências todas, mesmo as de lazer, e, às vezes, é o nosso lazer que nos permite encontrar a solução perfeita para os puzzles que tentámos decifrar no dia a dia.

Serve este pequeno ensaio para vos lembrar de procrastinar, porque só avança quem descansa.

 

Créditos fotografia: Bruno Mesquita

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