Entregas sustentáveis: investigadores querem apoiar retalhistas na resposta ao impacto ambiental do comércio online

Compras online e entregas just-in-time – ou quase. Este foi um cenário ao qual nos habituamos, nos últimos anos, e que foi sobretudo impulsionado pela pandemia de COVID-19. Certo é que ainda não é totalmente conhecido o impacto ambiental das novas estratégias de retalho, designadamente no que se refere a novos modelos de negócio e hábitos de consumo, associados ao comércio eletrónico – este foi o ponto de partida do projeto e-LOG, liderado pelo INESC TEC, e que chegou agora ao fim.

Ao longo dos últimos dois anos, uma equipa de investigadores do INESC TEC trabalhou no desenvolvimento de uma metodologia baseada num modelo matemático para comparar o impacto ambiental dos diferentes tipos de modelos de negócio de vendas no setor do retalho, considerando o modo de distribuição dos produtos. Agora, o objetivo é usar essa metodologia para apoiar o desenvolvimento de estratégias, otimizando as operações de logística, que contribuam para mitigar o seu impacto ambiental. Além disso, a equipa quer também aumentar o conhecimento disponível sobre a forma como a qualidade de vida nas cidades é afetada pelas políticas de transporte.

“Começamos por identificar um conjunto de regulamentos para gestão de operações logísticas em Portugal e na Europa, focados essencialmente na implementação de Planos de Logística Urbana Sustentável e definição de áreas de restrição de circulação, como por exemplo, zonas de baixas emissões ou zona de emissões reduzidas”, explica Tânia Fontes. Além disso, acrescenta a investigadora do INESC TEC, para caracterizar as operações das empresas de distribuição de encomendas foram analisados os modelos de negócio de três grandes empresas europeias na área da distribuição de cargas na última milha. “A distribuição de cargas na última milha, que se refere à fase final de entrega de uma encomenda, pode ser particularmente desafiante em determinados contextos, nomeadamente, no que ao centro das cidades diz respeito, quer pela sua configuração, quer pelas infraestruturas disponíveis, entre outros fatores”, avança a investigadora.

Por isso, uma das partes do trabalho de investigação focou-se na análise da distribuição de cargas na última milha na cidade do Porto. “O estudo que fizemos, que contou também com uma série de entrevistas a peritos, revelou algumas conclusões interessantes, desde logo que a utilização combinada de meios para entregas de encomendas é uma solução que se traduz num menor consumo de energia e numa redução das emissões de carbono, do que a solução tradicional baseada no uso de uma carrinha movida a combustível fóssil. Uma destas soluções pode passar por haver um depósito móvel, que pode ser uma carrinha ou camião, estacionado num determinado ponto da cidade, e pela utilização de bicicletas de carga que distribuem as encomendas aos clientes a partir deste depósito móvel”.

Outro dos fatores explorados pela equipa foi a topografia das cidades. “Avaliamos a utilização de quatro estratégias de entrega – com recurso a carrinhas movidas a combustível fóssil, carrinhas elétricas e bicicletas de diferentes dimensões – em três cenários com diferentes inclinações. Procuramos aferir sobre o desempenho em termos de consumo energético, emissão de gases poluentes, e duração da operação, e percebemos que uma carrinha elétrica será sempre a melhor opção para diferentes tipos de terreno”. Ainda assim, Tânia Fontes ressalva que em terrenos menos íngremes, as bicicletas de carga consomem menos energia, mas o tempo de entrega das encomendas é maior do que usando carrinhas elétricas.

No artigo “Towards sustainable last-mile logistics: A decision-making model for complex urban contexts”, publicado na revista Sustainable Cites and Society, a equipa apresenta os resultados deste trabalho de investigação, em particular um modelo que permite definir a forma de distribuição de encomendas numa zona histórica, tendo em conta diferentes interesses/perfis. “Os 67 perfis que definimos mostram que a solução mais adequada varia em função da orientação dos decisores relativamente a fatores ambientais, económicos e sociais. Por exemplo, a utilização de uma bicicleta de carga é entendida como mais vantajosa quando o foco é a sustentabilidade ambiental. Em contrapartida, se o decisor não tiver um perfil orientado para as questões ambientais, a solução mais vantajosa passa a ser o depósito móvel”, revela Tânia Fontes, acrescentando que, “curiosamente, quando um decisor atribui importância semelhante aos fatores Ambiental, Económico e Social, a diferença pela escolha entre o depósito móvel e a bicicleta de carga é mínima”. Segundo a investigadora, os resultados indicam ainda que a solução baseada na combinação de diferentes métodos de entrega, na última milha, tem um grande potencial.

Do projeto e-LOG resultou também uma solução, o Log-ON, que visa melhorar a gestão do acesso de certos veículos a determinadas zonas, em períodos específicos. “Sabendo que esta gestão das encomendas envolve diferentes atores, com necessidades específicas, e que pode haver determinadas restrições à circulação de veículos, combinamos informação de diferentes fontes, de forma que o nosso sistema de informação possa dar, em tempo real, informações sobre os vários tipos de restrições ou sobre a necessidade de se solicitar acesso a determinadas zonas de um centro histórico, por exemplo”, diz Tânia Fontes.

O projeto esteve ainda na base do desenvolvimento de oito dissertação de mestrado e de dois projetos de licenciatura. O Vasco Silva, um dos estudantes envolvidos no projeto, vai continuar a trabalhar esta questão da última milha, com especial foco nas questões colaborativas, através da sua Tese de Doutoramento, intitulada “A Hybrid Collaboration Model for Sustainable Last-Mile Logistics”.

 

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