O INESC TEC pensou “o mundo que muda a todo minuto”: o papel da ética na investigação e defesa está em cinco palestras – e agora todos podemos vê-las

A situação geoestratégica e a alteração das regras europeias de financiamento da investigação nas áreas da defesa não podiam deixar de desafiar o INESC TEC. Com o foco na questão da investigação, e sublinhando a importância da dimensão ética para o devir, as horas de discussão com cinco especialistas estão, agora, disponíveis para todos.

O INESC TEC lançou-se num ciclo de palestras sobre ética aplicada à investigação e defesa. Para compreender a importância e oportunidade destes temas, bastam uns minutos da sessão com o pensador Álvaro de Vasconcelos para ter uma resposta. Efetivamente, vivemos num tempo em que se acumulam “perguntas, interrogações, perplexidades”, e as “certezas e interpretações claras” são muito escassas: “o mundo muda a todo o minuto”.

O ciclo “INESC TEC Open Talks sobre Ética na Investigação e Defesa” pretende pois ajudar a pensar este mundo em constante transfiguração. Cinco sessões, cinco perspetivas de especialistas nacionais e internacionais para nos trazerem reflexões sobre o papel da Inteligência Artificial no contexto militar, os limites do reconhecimento facial, ou o direito de investigadores alegarem objeção de consciência. Tudo isto a acontecer num contexto de incerteza em que os cenários de guerra voltaram a entrar-nos casa adentro.

Pedro Guedes de Oliveira, presidente da Comissão de Ética do INESC TEC, adianta que “desde há muito” que toda a investigação relacionado com a vida “leva a uma particular atenção da comunidade científica para as questões da ética”. “O envolvimento de investigadores das áreas da engenharia nestas questões aproxima-nos desta problemática e tem de se refletir no nosso comportamento e nas nossas preocupações”, acrescenta.

É que estas “questões da ética” acompanham todo o processo científico e tecnológico. Catherine Tessier, diretora de investigação do ONERA, frisou isso mesmo: ética é levantar questões sobre “temas, situações e possíveis decisões e ações” e, por isso, não pode resumir-se a um questionamento prévio e facilmente descartado assim que o projeto de investigação tem início.

Pedro Guedes de Oliveira preside a Comissão de Ética do INESC TEC.

 

“Contribuir para a consciencialização”

Para além de Álvaro de Vasconcelos e Caterine Tessier, Virginia Dignum, Afonso Seixas-Nunes e Michael Teutsch foram também responsáveis pela troca de ideias “muito interessante e valiosa”.  Num momento em que existe uma “proliferação dos meios informáticos de acesso à informação” e a proteção da privacidade e dos dados pessoais salta para os cabeçalhos, Pedro Guedes de Oliveira, que é também presidente emérito do INESC TEC, defende que um instituto multidisciplinar como o INESC TEC deve “contribuir para a consciencialização” da comunidade relativamente a toda esta complexa problemática.

E mais. “Com o advento da IA, e devido à sua presença em quase todos os aspetos da nossa vida, enfrentamos novos problemas que desafiam e preocupam, quer num plano global, quer na nossa atividade profissional”, explica.

As conferências começaram em finais de 2024 e as gravações estão disponíveis no canal YouTube do INESC TEC, quer para quem não teve a oportunidade de assistir, quer para quem as queira rever. Está já prevista uma sexta conferência, a realizar ainda este ano.

Uma breve visita sobre as cinco conferências já realizadas

O ciclo de open talks começou com Catherine Tessier a perguntar: “O meu sistema de reconhecimento facial é 100% rigoroso – é uma boa notícia?” A diretora de investigação do ONERA – o laboratório aeroespacial francês, localizado na cidade de Toulouse, onde é também a responsável pelo gabinete de Ética e Integridade na investigação – discutiu a tão necessária ponderação ética que os investigadores devem colocar em prática, de forma paralela ao seu trabalho científico, de modo a poderem ir além de uma mera aceitação ou objeção.

Seguiu-se Virginia Dignum, docente na Universidade de Umeå, na Suécia, e membro do grupo de peritos de alto nível da Comissão Europeia sobre Inteligência Artificial.  A especialista portuguesa apresentou uma sessão intitulada “Para além da moda da IA: o equilíbrio entre inovação e responsabilidade social” e frisou que responsabilidade no contexto da IA envolve regular, governar, sensibilizar e também desenhar sistemas que tenham em consideração valores, implementação de regulação, governance, monitorização e respeito por acordos e normas.

Já Álvaro de Vasconcelos, fundador do Fórum Demos e detentor da Cátedra José Bonifácio da Universidade de São Paulo, centrou o debate na necessidade de um novo multilateralismo; e como o caminho para o futuro se deve fazer acompanhar por uma agenda de compaixão, “de defesa dos direitos daqueles que não têm direitos, e de justiça social.”

Na quarta sessão, Afonso Seixas-Nunes, padre e professor de Direito, arrancou com uma pergunta: o raciocínio subjetivo tradicional pode de facto ser substituído por sistemas de IA? A conversa acercou-se da atualidade, através da guerra em Gaza, para refletir sobre a questão da “proporcionalidade” em contexto de guerra.

O encerramento desta primeira parte do ciclo de talks ficou a cargo de Michael Teutsch, estratega e líder de IA na HENSOLDT. O especialista explorou a integração da IA para usos militares, realçando a importância do cumprimento de diretrizes éticas.

Como referido, o ciclo prosseguirá, ainda este ano, com uma conferência a anunciar para finais do mês de novembro.

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