Integrar para transformar: a inovação como motor industrial

Havia gente a chegar antes da hora. Uns com cadernos, outros com perguntas, outros só a observar. A sala foi ganhando som, como se se afinasse para o que aí vinha. Não era um congresso qualquer – era um encontro com o que está a mudar, aos poucos, a forma como produzimos, transportamos e pensamos a indústria. Feito de sensores e decisões, de algoritmos e empilhadores, mas também de pessoas, hesitações e colaborações que ainda se estão a aprender. 

O PRODUTECH R3 SUMMIT e o Open Day do iiLab (Laboratório de Indústria e Inovação do INESC TEC) aconteceram assim. Não como momentos solenes, mas como interrupções produtivas da rotina. Dois dias para ver, escutar, perguntar, experimentar. E o INESC TEC esteve no centro – com as suas equipas, os seus centros, os seus parceiros – numa disposição clara de cruzar fronteiras entre sectores, entre linguagens, entre formas de estar na indústria. 

A Agenda Mobilizadora PRODUTECH R3 

O PRR PRODUTECH R3 é uma das maiores iniciativas de reindustrialização inteligente em curso em Portugal. Estruturada como uma Agenda Mobilizadora financiada pelo Plano de Recuperação e Resiliência, integra mais de 100 entidades e cobre toda a cadeia de valor da indústria transformadora. O seu foco está na transformação digital, verde e resiliente da indústria, com ênfase em tecnologias avançadas, sustentabilidade operacional e valorização de conhecimento nacional. 

O PRODUTECH R3 SUMMIT 

A manhã do dia 2 de julho começou com uma ambição clara: refletir, em voz alta, sobre o papel da indústria num país e num continente em transformação. Vieram representantes institucionais, decisores políticos, empresas e centros de I&D. Vieram não só para apresentar, mas para ouvir, perceber em que ponto estamos – e o que falta fazer. 

Entre os discursos iniciais, ficou evidente um consenso: a reindustrialização europeia exige mais do que vontade – exige política, coordenação e visão de longo prazo. Maurizio Gattiglio, chairman da plataforma MANUFUTURE, não escondeu a inquietação ao falar das vulnerabilidades estratégicas da Europa, da crescente distância face a blocos como E.U.A. e China, e da necessidade de uma resposta industrial clara, baseada em valor acrescentado, inovação e autonomia. 

Ulrich Adam, da Orgalim, trouxe para cima da mesa o desafio regulatório. Nem sempre é fácil inovar em ambientes complexos e lentos. Mas é aí que se vê quem quer, de facto, transformar. Miguel Almeida Henriques, da PRODUTECH, recordou que as tecnologias de produção – muitas vezes invisíveis – são essenciais para sustentar a competitividade e preparar o país para novas cadeias de valor. 

Ao longo da manhã, o ambiente foi de atenção e pragmatismo. Falou-se de investimento, de política industrial, mas também de confiança – entre setores, entre empresas, entre instituições. Ficou claro que os desafios são grandes, mas que existe, no ecossistema representado na sala, uma base sólida de competência e de vontade. 

O INESC TEC participa de forma transversal, com contributos em muitos dos Produtos, Processos e Serviços (PPS) desenvolvidos na Agenda. Através de equipas multidisciplinares – em áreas de atuação que vão desde Engenharia de Sistemas Empresariais, Robótica Industrial e Sistemas Inteligentes, Engenharia e Gestão Industrial, Telecomunicações e Multimédia à Inteligência Artificial e Apoio à Decisão -, o INESC TEC colidera várias frentes tecnológicas: desde a robótica colaborativa ao 5G industrial, passando pela simulação, visão por computador, inteligência artificial e integração de dados. É também responsável pela estruturação e gestão operacional dos workpackages (WP) 3 “Smart Factories” e WP9 “Smart Intralogistics” – este último considerado o pilar transversal para intralogística, envolvendo integração e demonstração tecnológica da Agenda – e pelo acolhimento de diversos eventos de demonstração e articulação técnica, como o Open Day no iiLab. 

Mais do que um parceiro, o INESC TEC assume nesta agenda o papel de elo integrador entre a geração de conhecimento, a validação tecnológica e a aplicabilidade industrial – sempre em articulação com empresas demonstradoras, fornecedores de tecnologia e consultoras de gestão e inovação. 

A mesa-redonda: onde a estratégia encontra o chão de fábrica 

Fechando o primeiro dia, a mesa-redonda dedicada à intralogística inteligente funcionou como um contraponto necessário. Depois das grandes ideias e das macrovisões, o foco voltou-se para dentro – para o concreto, o operativo, o que já está a ser feito com os meios que existem e com a realidade que se impõe. 

Com contributos da The Navigator Company, SONAE MC, Kaizen Institute e INESC TEC, o debate revelou uma paisagem industrial que está longe de ser homogénea, mas que partilha inquietações semelhantes: como reorganizar a logística interna com base em dados, como tirar partido da robótica e da simulação, como transformar sem paralisar. 

As experiências partilhadas não se sobrepuseram – completaram-se. A SONAE falou da aplicação de gémeos digitais nos centros logísticos. A Navigator trouxe a visão de quem opera em escala industrial pesada, mas quer flexibilizar. A Kaizen lembrou que não basta mudar sistemas – é preciso mudar rotinas, pessoas, métricas. E o INESC TEC esteve ali como quem escuta e traduz, alinhando exigências e capacidades, criando espaço para que a integração aconteça. 

A mesa não procurou um consenso. Procurou pontos de contacto. E, nisso, foi talvez o momento mais revelador do Summit: quando a transformação deixa de ser uma narrativa e se torna prática partilhada, com margem para dúvida, erro e avanço continuado. 

Tecnologia em movimento: o Open Day do iiLab como espaço de encontro e demonstração 

Há dias em que a tecnologia deixa de ser conceito e passa a ser encontro. No passado dia 3 de julho, o INESC TEC e a NOS promoveram em conjunto o Open Day do iiLab, uma iniciativa pensada para mostrar, ao vivo, o que acontece quando a investigação aplicada encontra condições reais de operação industrial. 

Ao longo de uma tarde de portas abertas, os visitantes circularam pela Nave A do edifício do INESC TEC, num formato que privilegiou a liberdade de exploração, as demonstrações ativas e o contacto direto entre equipas técnicas, decisores e potenciais parceiros. Este não foi um evento com discursos. Foi um evento com movimento – no sentido literal, e no simbólico. 

No centro da iniciativa esteve o iiLab – o Laboratório de Indústria e Inovação do INESC TEC. Concebido como um ambiente modular de demonstração e validação tecnológica, o iiLab tem vindo a afirmar-se como um espaço de ligação entre a investigação e a indústria. Foi aqui que se realizaram, nos últimos dois anos, testes e ensaios de sistemas logísticos baseados em robótica móvel, algoritmos de visão por computador, gémeos digitais e integração com 5G industrial. E foi aqui, também, que a parceria com a NOS encontrou forma de se concretizar numa infraestrutura de comunicações 5G dedicada à vertical da indústria, permitindo ensaios e prototipagem em condições realistas. 

Durante o Open Day, estas capacidades ganharam expressão concreta. Visitantes puderam ver, em funcionamento, soluções como empilhadores autónomos com sistemas de controlo remoto e lógica de navegação inteligente, AMRs a operar com coordenação dinâmica de tarefas, algoritmos de deteção e localização de paletes, interfaces de visualização de dados em tempo real, e sistemas de apoio à decisão logística em ambientes simulados e físicos. Cada ponto da nave estava ocupado por uma demonstração em funcionamento, mediada por investigadores, engenheiros, estudantes e técnicos que explicavam tanto o que estava a acontecer como o que ainda falta resolver. 

A presença da NOS foi visível não apenas na infraestrutura 5G – que sustentou todas as comunicações entre dispositivos e servidores locais – mas também na partilha de visão sobre o que significa construir um ecossistema industrial preparado para a conectividade avançada. Foi um momento de convergência entre telecomunicações, software, automação, sistemas ciberfísicos e as realidades do chão de fábrica. 

Mais do que apresentar tecnologias, o Open Day apresentou relações: entre instituições, entre equipas, entre sistemas. Num mundo onde tudo tende à integração, o iiLab posiciona-se como um lugar de passagem obrigatória para quem quer transformar a indústria a partir do conhecimento. Com o Open Day, essa vocação ficou visível para quem passou – e ficou em aberto para quem quiser entrar. 

Epílogo 

O sucesso de iniciativas como o PRODUTECH R3 SUMMIT e o Open Day do iiLab não nasce do acaso. São o reflexo de um trabalho coletivo, paciente e tecnicamente exigente, que acontece todos os dias – longe dos holofotes. Por trás de cada demonstrador funcional, de cada painel bem moderado ou de cada tecnologia integrada, estão pessoas: investigadores, estudantes, técnicos, engenheiros, coordenadores que, a partir de várias equipas internas do INESC TEC, tornam possível aquilo que o público só vê no momento final. 

Este texto não poderia terminar sem um agradecimento explícito a todos os que participam, de forma direta ou indireta, nos desenvolvimentos do PRR PRODUTECH R3. É o seu rigor, a sua disponibilidade, o seu engenho e a sua persistência que permitem transformar projetos em resultados, e resultados em impacto real. A todos, o nosso reconhecimento. 

Por Pedro Senna, investigador e gestor de projeto

PHP Code Snippets Powered By : XYZScripts.com
EnglishPortugal