Isabel fala do INESC TEC há mais de 20 anos. E não dá sinais de se cansar

Nasceu em França, onde viveu os primeiros 15 anos, mas, se lhe perguntarem, diz que é de Vidago. Isabel Macedo pensava que o INESC seria só um estágio de poucos meses, mas passaram 22 anos. Responsável pelo Serviço de Apoio à Gestão, acabou por “gostar mesmo disto” – e nota-se.

Há bilhetes da sorte que vêm nos jornais. Em 2003, é certo que havia – pelo menos – um. No meio das páginas a retratar um país “de tanga” que Durão Barroso queria vestir e as consequências de uma cimeira na base das Lajes, um anúncio nos “classificados” falava de um estágio profissional sem sequer se desdobrar em explicações – nem dizia onde aconteceria. Só depois de se candidatar é que Isabel Macedo tem notícias de que foi uma das selecionadas para uma prova e finalmente sabe onde a esperem. Até tem de pedir que soletrem: I-N-E-S-C.

Isto foi há mais de 20 anos. Agora, já há pouco que precise de ser soletrado. Isabel Macedo é responsável do Serviço de Apoio à Gestão do INESC TEC. Têm sido tempos preenchidos: desde o apoio direto às atividades da administração à gestão dos processos correntes e da informação de uma casa que conta décadas de fulgor, são muitos anos a falar e a moldar a linguagem do INESC TEC. Nunca se cansou? “Não, porque gosto mesmo disto”, acaba por responder, com um sorriso por disfarçar.

Mas quando acaba o curso de Relações Internacionais na Universidade do Minho e lhe apontam para o tal quadradinho no jornal, via um horizonte diferente: trabalhar numa grande empresa, com sistemas de informação sofisticados e processos bem desenhados. Não era fácil prever que o teste de aptidões que veio fazer ao INESC – não sem antes recorrer à “internet ADSL” para procurar o que lhe tinham soletrado – fosse o prólogo de uma história que não pára de somar capítulos.

“É impressionante: eu não lembro muita coisa de há cinco anos, ou do ano passado. Mas, de há mais de 20 anos, lembro-me perfeitamente. Tinha acabado de sair do curso e o meu objetivo era conseguir um cargo no Porto, porque imaginava que, a partir daí, seria mais fácil tentar recrutamentos. Na altura, achava que a vaga era provisória”, recorda. Acabou por não ser.

Falar INESC

Quando dá com o INESC, encontra mais 100 candidatos interessados na vaga. “Por sorte, fui passando as etapas de recrutamento e lá fiquei”. E foi em boa altura. O Instituto precisava de ajuda na coordenação geral do Departamento de Informação e Logística (o DIL, um serviço que agrupava contabilidade, controlo de gestão, recursos humanos, entre outras valências). Contavam com Isabel para explicar o bê-á-bá do INESC TEC: o primeiro grande desafio passa por preparar o manual de acolhimento da instituição.

Depois de soletrar, estava pronta para escrever as primeiras frases. E aí valeu-lhe Graça Barbosa, atual membro do Conselho de Administração. É quem lança o edital, recruta e lhe faz o onboarding. “A cada trabalho que eu lhe apresento, sei que vou receber inputs que me vão ajudar a perceber melhor o INESC e a melhorar a minha forma de fazer as coisas”, explica. Enlaça memórias de horas, lado a lado, a sorver as dinâmicas da estrutura complexa e intrincada que era o Instituto.

Isabel Macedo no Encontro Estratégico do INESC TEC.

“No serviço devíamos ser umas 18 pessoas. O meu primeiro dia foi espetacular. Era a benjamim do serviço e é a Graça que me ajuda nesses primeiros tempos. Eu acho que, até hoje, conheço bem o INESC TEC porque tinha uma pessoa tão dedicada e tão perto, e com uma capacidade de trabalho brutal. Tinha perfeita noção de que ela estava horas a falar comigo, depois eu ia embora e ela ficava a trabalhar”.

Diz que que também teve muita sorte: fazer o manual de acolhimento acabou por ser a melhor forma de conhecer a casa, porque tem uma oportunidade por falar com praticamente todos os principais atores. O DIL que Isabel conheceu em 2003 desagregou-se há muito: a forma como se pensava a instituição há 20 anos está muito longe de ser a mesma. Em 2012, cimenta a expansão e o edifício dobra em tamanho. O INESC Porto deixou cair o “Porto”, em 2015, e abraçou o TEC. E se é verdade que a escala pode “desumanizar”, a verdade é que, “mesmo assim, a instituição conseguiu ficar um bocadinho mais humana, parece-me”.

O eixo certo: talento, criatividade e humanismo

Isabel estava lá, viu isto tudo a acontecer. São 22 anos a falar do INESC TEC. Mudou de funções recentemente e o caderno de encargos, agora, resvala para a supervisão da gestão integrada da informação e o estímulo da melhoria contínua nos processos de negócio.  A jovem recém-licenciada que sonhava com a vida empresarial deixou-se ficar. A explicação de Isabel é simples:  sim, é verdade que o carácter transversal das tarefas ajuda, assim como a evolução que assistiu à conta de desafios que foi desatando – 18 anos a dar apoio à administração dá acesso a uma fotografia bem fiel da evolução de uma instituição.  Mas o que a faz ficar é mais simples: duas décadas passaram a correr com as pessoas certas ao lado e um sentido de missão. Fala da confiança que recebeu de antigos e atuais membros do Conselho de Administração, como Mário Jorge Leitão, José Manuel Mendonça, Gabriel David, João Claro; e realça o papel de Paula Faria, uma das colegas que “permitiram que crescesse muito”.

“Encontrei aqui pessoas de um talento e criatividade enormes, humanamente muito ricas e com um sentido de cooperação que, sinto, provavelmente é muito difícil de encontrar lá fora, bem como um propósito, de dar algo à sociedade. Sinto, desde que entrei, que aqui as pessoas contam muito”, frisa.  Avança com o exemplo que conhece melhor: o seu. “Pude estudar enquanto trabalhava, fiz um mestrado, o MBA e sempre tive o máximo apoio quando fui mãe”.

Só falta tempo para “destralhar” – mas também não se pode ter tudo. Na senda de “arquivistas frustrados”, também Isabel Macedo se dava por contente se pudesse dedicar mais tempo à gestão de arquivos (o fascínio casaria com a obrigação, já que é algo que está, inclusive, dentro do pelouro). Admite que é tarefa “pouco sexy”, por isso, aproveita para projetar o devir: “Eu costumo dizer que quando as minhas capacidades declinarem, e mesmo se ainda assim me quiserem por perto, eu não me importava de ter mais tempo para isso. Faço muito isso em casa, para desespero da minha família”.

Entre França e Trás-os-Montes, a comédia britânica

O INESC TEC mudou e Isabel também. Diz que hoje está mais “engenheira e quadrada”, quase por efeito de contágio. Feliz por nunca ter encontrado no INESC TEC algo que roce a ideia de rotina – não conheceu dois processos iguais na sua secretária –, encontra sempre “espaço” ao longo do dia para “refletir e desenvolver ideias e pensar soluções”. Só que a vista desafogada que um quarto piso no Campus da Asprela oferece para a luta diária a acontecer todos os dias na Circunvalação não se equipara ao cenário a que se habituou quando chegou a Portugal vinda de França, onde passou os primeiros 15 anos.

É que agora já não se dá conta, e só um ouvido muito atento deslinda um ou outro reflexo de fuga para os anos em que não conhecia Vidago, o “local preferido”. “Eu digo que sou de Vigado quando me perguntam de onde é que eu sou, mas eu só vivi lá os três anos de liceu antes de entrar para a universidade”. Nasce em Lons-le-Saunier, região da Borgonha-Franco-Condado, leste de França, cresce na cidade de Poligny, mas é a Trás-os-Montes – terra “de pessoas com um coração enorme” – e ao parque do Vidago Palace que se vê sempre a regressar para “carregar baterias”. Sempre “velhinha” nos hobbies, à volta dos livros e das plantas, prefere passar os serões a ver o melhor da britcom na televisão.

Num espaço seguro desenhado entre França, Vidago, o Minho e o Porto, Isabel mora, agora, nos arredores da cidade. O INESC TEC acabou por nortear o raio de ação em boa parte destes anos. Em 2003 e 2025, Isabel perscruta algo idêntico: “não se atravessam tempos muito fáceis”. Encontrou no INESC TEC uma certeza em ambos os momentos, quer na primeira ida ao auditório na companhia de 100 aspirantes, quer 22 anos depois – curiosamente, na mesma sala onde fez a prova: “Há aqui uma crença de que se pode fazer sempre melhor e crescer. Em tempos muito incertos, sou parte de uma instituição que acredita que a ciência é um caminho para melhorar a vida das pessoas. Acho que isto é um propósito muito grande”. Nada mau para um quadradinho no jornal.

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