Estudos mostram que pessoas com baixos rendimentos, imigrantes, jovens e idosos são as mais afetadas pelo contexto de uma Europa em transição. O projeto europeu RECONNECTED quer interligar estas comunidades vulneráveis, contando com o INESC TEC para desenvolver uma plataforma de apoio digital.
Uma guerra que dura há dois anos, alterações climáticas, migrações e os desafios da digitalização: como é que os cidadãos europeus se têm adaptado a este contexto? E qual o estado da nossa saúde mental? É este o ponto de partida para o projeto RECONNECTED, que quer compreender como estes desafios impactam a saúde mental dos cidadãos europeus e desenvolver ferramentas “capacitadoras e não estigmatizantes”, construir resiliência psicológica e estimular a participação social.
O INESC TEC desempenha um papel crucial como parceiro no projeto, encarregado de desenvolver a solução de apoio digital a comunidades socialmente desfavorecidas e, assim, “promover a resiliência e interligar cidadãos vulneráveis”. A plataforma a ser desenvolvida será baseada em software previamente desenvolvido pelo Instituto no âmbito de outros projetos na área da saúde mental — nos quais colaborou com a Universidade Livre de Amesterdão (VUA) —, entidade coordenadora do projeto RECONNECTED.
Esta plataforma será desenvolvida em colaboração com intervenientes das comunidades locais em nove países europeus, seguindo um protocolo de investigação participativa. “Baseada num framework desenvolvido com uma perspetiva de sistemas complexos, a plataforma será capaz de responder às alterações na saúde mental provocadas pelos desafios globais identificados, proporcionando uma melhor compreensão da forma como os fatores de risco e de proteção aos níveis individual, social e ambiental interagem dinamicamente e impactam a saúde mental”, relata Gonçalo Campos Gonçalves, investigador do INESC TEC.
O “grande potencial” das soluções digitais
O principal objetivo da plataforma é oferecer uma resposta adaptativa e personalizada às necessidades individuais dos participantes, “demonstrando assim um potencial significativo no apoio à saúde mental”. “A plataforma irá atuar em diferentes frentes, tais como a literacia em saúde mental, prescrição social e micro-intervenções personalizadas, fazendo uso de ferramentas de intervenção via web e aplicação móvel”, acrescenta o investigador.
Soluções digitais como esta têm, segundo o projeto, um “grande potencial” e são adequadas tanto para ações preventivas como “para a capacitação dos cidadãos na comunidade, tornando os cuidados de saúde mental e a prevenção acessíveis, económicos e seguros”.
A estratégia do projeto está alinhada com o plano de ação da Comissão Europeia. Os números são preocupantes. No primeiro ano da pandemia, a ansiedade e a depressão aumentaram 25 % em todo o mundo e na União Europeia a perceção de solidão cresceu mais de 20%. Mas a pandemia só veio abrir uma ferida que já existia: mesmo antes dos confinamentos sucessivos, pelo menos 84 milhões de pessoas em toda a UE revelavam problemas de saúde mental. E há estudos que sugerem que a saúde mental dos cidadãos marginalizados e vulneráveis – pessoas com baixos rendimentos, imigrantes, os mais jovens e os idosos –, é a mais afetada pelo contexto de transição que a Europa atravessa.
No âmbito do projeto, serão conduzidos ensaios clínicos aleatórios em várias comunidades vulneráveis europeias, em nove países: jovens dos 16 aos 25 anos (Dinamarca), homens de 17 anos ou mais recrutados para o serviço militar obrigatório (Finlândia), população adulta com baixo nível socioeconómico (França), jovens dos 12 aos 16 anos (Alemanha), população adulta com baixo nível socioeconómico (Kosovo), idosos com 55 anos ou mais (Holanda), migrantes adultos da América Latina (Espanha), idosos com 55 anos ou mais (Suíça) e migrantes adultos, não ocidentais (Reino Unido).
“Os resultados dos ensaios serão ponderados em relação aos critérios de otimização predefinidos em cada população vulnerável para fazer recomendações sobre a versão mais ótima (em termos de efeito, eficiência, economia, escalabilidade) da intervenção”, refere o investigador.
O INESC TEC é um dos 11 parceiros do RECONNECTED, um consórcio que junta conhecimento de diversas áreas de conhecimento, desde a psicologia à ciência de dados. O consórcio, pode ler-se no site do projeto, vai treinar jovens investigadores para que se tornem especialistas na área da saúde mental de carácter comunitário, capacitando-os com conhecimento para “proteger a saúde mental em tempos de mudança”.