O Livro Anteprimeiro

O Padre António Vieira faleceu em 1697 e, porque gostamos de forçar coincidências, trezentos anos depois ocorria a morte de um conceito subserviente de INESC Norte – para a fénix renascer no ano seguinte na forma de INESC TEC, ainda e porém com o tímido nome de INESC Porto. Custou a descolar do regionalismo, mas os tempos têm o inconveniente costume de tenderem a impor soluções menos boas, sob o argumento de aceitáveis. 

Porque era homem de obra, não teve medo de afrontar. Com meridiana lucidez, terá escrito:  

Somos o que fazemos. Nos dias em que fazemos, realmente existimos; nos outros, apenas duramos. 

Essa crua consciência comandava os impulsos da geração que avançou com a empreitada de erguer um INESC nosso que se projetasse, que fosse além da margem do Douro, que criasse e ousasse além da paróquia. 

Sem pensar no Padre, seguimos-lhe o exemplo. Porque ele, homem de pensamento político e diplomático, reflexão humana e filosófica, compreendera que não bastava às ideias a virtude para se imporem: era preciso comunicar. As ideias não têm valor em si, valem quando outros se apoderam delas. E, por isso, com tenacidade, com fúria mesmo, pôs ao serviço das ideias os dons, que nele eram mágicos, da palavra escrita e proferida. No arejado Maranhão ou nos calabouços da Inquisição, escreveu gemas literárias inigualáveis de imaginação e raciocínio. Ler os seus sermões é ouvi-lo falar, custa resistir à conversão às ideias que propusesse. 

Pois se o INESC TEC era a obra a fazer, o BIP seria a voz – importante era chegar aos outros, mostrar o que somos e, por essa via, mostrar quem somos. 

Na conceção original, o BIP não era institucional – era irreverente sempre que possível. A ideia era de que, para ser eficaz, não poderia ser visto como a voz do dono. Ler comunicados oficiais é chato, noticiar com emoção é atrevido e interessante. Por isso, o formato original incluiu um cartoon politicamente incorreto que perdurou por muitos anos e criou não poucas polémicas. Mas a comunicação é assim, só somos reais quando falam de nós.  

Tal como o Padre António Vieira, o BIP atravessou os oceanos, chegou a outros mundos, impactou em outras almas – uma afirmação do existir planetário, da ambição de ser mais, recusando o cárcere das fronteiras, e o pior são as mentais. 

Ao fim de 250 números, com outro formato, adaptado porventura aos tempos ou costumes, já não é preciso prova de vida. É claro que o Padre não perdoou na análise: 

A pior coisa que têm os maus costumes é serem costumes: ainda é pior que serem maus. 

É por isso que o BIP deve ser um reflexo do INESC TEC e reinventar-se em permanência. E retomado o bom vento e o bom rumo, não ser apenas um costume, mas a voz das pessoas, o brado das gerações de agora que continuam exigindo um INESC TEC que as orgulhe. 

Não creio que peçam uma estátua de cera. Acho que preferem que se assuma como o padre inquieto, o pensador excelente, o humanista impenitente, o pai açu, o visionário utópico que escreveu a História do Futuro.

Vladimiro Miranda, Diretor Associado

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