Como reagimos às publicações nas redes socias sobre as alterações climáticas? Este foi o ponto de partida de um estudo internacional, no qual o INESC TEC colaborou, e que analisou quase 2 milhões de publicações na rede social X (antigo Twitter), feitas ao longo de 12 anos na Península Ibérica.
Surpresa, raiva e ironia. É assim que os cidadãos se expressam quando o tema são eventos climáticos extremos. Ana Sofia Cardoso e Alípio Jorge, investigadores do INESC TEC, são coautores do estudo que foi publicado na revista Scientific Reports (Grupo Nature).
O estudo, que envolveu instituições de Portugal, Espanha, Chéquia e França, usou técnicas avançadas de processamento de linguagem natural (Natural Processing Language – NLP – na versão anglo-saxónica) e deep learning, no período entre 2010 e 2022. Os resultados mostram que 39% das publicações, frequentemente associadas a fenómenos como incêndios, secas e tempestades, expressam sentimentos negativos e 35% são neutras.
Entre as emoções mais identificadas estão a raiva, a surpresa e, em menor grau, a alegria. A frequência de publicações associadas a raiva aumentou nos últimos quatro anos, refletindo uma maior inquietação pública com os impactos e respostas (ou ausência delas) à crise climática. A ironia, usada como forma de crítica ou desabafo, representou cerca de um quarto dos conteúdos — um traço particularmente visível em Portugal e Espanha. Picos de atividade emocional foram registados em eventos como os incêndios de Pedrógão Grande (2017), a tempestade Ophelia (2019) ou a onda de calor de 2022 que conduziu à destruição de 57.000 hectares e evacuação de milhares de pessoas.
“Estudos como este reforçam a importância de monitorizar o discurso público nas redes sociais como ferramenta complementar de planeamento climático e resposta a crises”, salienta Alípio Jorge.
A equipa do INESC TEC teve um papel essencial na aplicação e treino de modelos de linguagem BERT-based (Bidirectional Encoder Representations from Transformers). Estamos, portanto, a falar de algoritmos treinados com grandes volumes de dados textuais em português, espanhol e inglês e que podem ser retreinados para tarefas mais específicas como a análise de sentimentos.
“Este trabalho insere-se na linha de investigação contínua do INESC TEC na área de NPL, nomeadamente na aplicação de modelos de linguagem treinados para tarefas específicas, como já acontece noutros contextos como o projeto Citilink. A metodologia que desenvolvemos é escalável e replicável. Tem potencial para ser aplicada em novas investigações e contextos, seja em ciências sociais, comunicação de risco, ou apoio a políticas públicas”, acrescenta Alípio Jorge.
Os investigadores mencionados na notícia têm vínculo ao INESC TEC e à Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP).