Tecnologia e Parkinson: INESC TEC apoia Profissionais e Pacientes

Por Adriana Arrais e Duarte Dias, investigadores do Centro de Investigação em Engenharia Biomédica (C-BER), e João Paulo Cunha, coordenador do Centro

A doença de Parkinson é uma doença neurodegenerativa, a segunda mais comum depois da doença de Alzheimer, e a sua incidência a nível mundial está a aumentar a um ritmo mais acelerado do que qualquer outro distúrbio neurológico. Sem cura até ao momento, os tratamentos existentes focam-se na redução das limitações causadas pelos sintomas existentes.

A habitual monitorização dos doentes e avaliação do estado e progressão do problema, como amplamente conhecido, são realizadas nas consultas médicas que cada paciente tem. Numa perspetiva geral do que ocorre durante uma consulta, é comum o médico ouvir os relatos detalhados do paciente sobre os seus sintomas e preocupações, realizar exames físicos para averiguar o estádio da doença, e com base nessas informações, manter ou ajustar a terapia do paciente.

Esta monitorização em consultas tem associadas muitas limitações. Uma delas é a reduzida frequência com que se realizam estas marcações. Além disso, a avaliação médica é subjetiva, variando consoante a perceção e a experiência de cada profissional de saúde. Outro fator a considerar é a descrição qualitativa dos pacientes, alterada pela sua perceção pessoal. Estas lacunas constituem um obstáculo à avaliação do estado do paciente ao longo do tempo, pelo que cada vez mais se tem procurado desenvolver estratégias de monitorização complementares e mais quantitativas para um melhor acompanhamento dos doentes ao longo da doença.

Em que consistem estas soluções?

O desenvolvimento destas soluções tem sido direcionado para a utilização de dispositivos wearables que estes permitam a medição de sinais de movimento de forma não invasiva e sem fios. Estes dispositivos vão desde relógios a simples bandas com eletrónica embebida em têxteis, colocados num ou mais membros.

A quantificação dos sintomas é recorrentemente realizada com base nas escalas seguidas pelos médicos para avaliarem os seus pacientes, por meio de métodos de aprendizagem computacional. A monitorização tem duas metodologias principais: monitorização contínua ou monitorização pontual. Ambos os métodos podem dar feedback do paciente em casa, como durante a avaliação física nas consultas médicas.

O que permitirão?

Para a prática médica, este tipo de soluções trará benefícios significativos, nomeadamente a possibilidade de terem um suporte objetivo na avaliação física em consulta, ao ser fornecido uma avaliação quantificada dos sintomas. Os dados recolhidos em casa complementam a avaliação em consulta. Esta informação adicional permite uma compreensão mais aprofundada dos padrões da doença e assim, otimizar o tratamento de um modo direcionado a cada paciente.

Os pacientes beneficiarão de uma melhor qualidade de vida, dada a possibilidade de terem um tratamento mais personalizado e adaptado que controlará mais eficazmente os sintomas. No caso de a solução incluir uma interface para o paciente, como uma aplicação móvel, possibilitará um maior envolvimento deste no tratamento, permitindo uma melhor compreensão da sua condição.

Até haver uma cura para a doença, a monitorização quantificada dos sintomas é uma grande esperança para os médicos que poderão dar um melhor tratamento aos seus pacientes. E por consequente, dará uma melhor qualidade de vida aos pacientes, o verdadeiro objetivo final dos tratamentos da doença de Parkinson.

Desafios

Há ainda muito trabalho a ser realizado para tornar esse tipo de ferramenta numa prática comum no dia-a-dia dos neurologistas e dos pacientes com doença de Parkinson.

A nível técnico, existem algumas dificuldades, no caso da recolha contínua de dados, a dificuldade em distinguir movimentos aleatórios do quotidiano de momentos em que estão presentes sintomas. Outra limitação é a dificuldade em obter dados de todos os níveis de severidade, já que a maioria dos pacientes apresenta sintomas com severidade intermédia.

Numa visão global, é necessário um trabalho continuo para superar os desafios técnicos e otimizar a utilização deste tipo de tecnologia. Isto envolve o desenvolvimento de quantificação mais precisa e a criação de interfaces informativas e intuitivas. Além disso, é essencial que as soluções sejam desenvolvidas considerando a comodidade dos pacientes, para que interfiram o menos possível com a sua vida quotidiana.

No INESC

No laboratório BRAIN do C-BER, a investigação e desenvolvimentos relativos à doença de Parkinson já decorrem há cerca de nove anos (desde 2014) e focam-se na quantificação dos sintomas motores da doença, contando sempre com uma forte relação com o Centro Hospitalar Universitário de São João (CHUSJ), indispensável para os desenvolvimentos.

Tudo começou numa conversa com os médicos de como os poderíamos apoiar numa prática realizada nas cirurgias de estimulação cerebral profunda – colocação de elétrodos profundos no cérebro para estimulação e consequente redução dos sintomas motores. Após várias iterações desenvolveu-se um sistema composto por um wearable e uma aplicação móvel que classificava a melhoria da rigidez durante estas cirurgias enquanto o doente está no bloco operatório acordado. Este método permite otimizar o local e a configuração da estimulação para obter o melhor resultado clínico. Estes desenvolvimentos resultaram na criação de um dispositivo wearable patenteado e do algoritmo de quantificação, ambos já licenciados à spinoff InSignals Neurotech que está a preparar estudos clínicos Europeus para validação clínica da solução.

Atualmente, utilizamos esse mesmo wearable, mas expandimos o foco para o desenvolvimento de um sistema que incorpora uma aplicação móvel com de algoritmos de quantificação dos vários sintomas motores integrados (para uso médico e do paciente) e ainda de uma plataforma para que os clínicos possam analisar os dados dos seus pacientes. Para este estudo contamos mais uma vez com o CHUSJ, onde temos a decorrer um estudo conjunto e onde recolhemos semanalmente dados de movimento de doentes de Parkinson para elaborarmos os algoritmos de quantificação dos sintomas. Em breve contamos testar os resultados obtidos, tanto no hospital, como em casa dos pacientes, para aferir a viabilidade do uso desta tecnologia de forma independente pelos doentes.

Desenhando uma solução o mais flexível possível para uso no contexto clínico ou em casa pelos pacientes, pretende-se oferecer uma solução mais completa do que todas as já apresentadas até ao momento para um melhor tratamento e acompanhamento dos doentes.

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